Do Diesel à Energia Solar: Como a Energia Solar Está Transformando e Empoderando uma Comunidade Amazônica
Fotografias e vídeos: Jenifer Veloso
Aninhada nas profundezas do sul da Floresta Amazônica, Vila Limeira é uma vila situada a 70 milhas (113 quilômetros) da cidade mais próxima e acessível apenas por barco. Esta área é a linha de frente de um conflito ambiental crítico — onde as apostas incluem a sobrevivência da floresta e o futuro de seu povo.
Vila Limeira está localizada dentro da Reserva Extrativista Médio Purus, uma zona protegida pela legislação brasileira. A reserva é ameaçada diariamente por desmatamento ilegal e pecuária. Os “Ribeirinhos”, povos tradicionais, dependem do ecossistema diverso da floresta para sua sobrevivência. Diversificar a produção econômica nessas comunidades extrativistas é essencial para preservar a floresta e proteger os meios de subsistência.
Nos esforços para proteger tanto a floresta quanto a comunidade, Vila Limeira adotou soluções de energia sustentável. A vila de 90 habitantes, que antes tinha acesso limitado à eletricidade — dependendo fortemente de geradores a diesel que forneciam apenas três horas de eletricidade por dia — é agora a primeira comunidade no sul do Amazonas com 100% de energia solar.
“A chegada da energia solar trouxe muitas melhorias para nós”, disse Raimunda Ferreira de Oliveira, que vive em Vila Limeira há 24 anos. “Estamos criando empregos, melhorando nossa agricultura, nossa renda e — no geral — uma vida melhor.”
No passado, Ferreira de Oliveira começava o dia cedo, antes que o calor incessante se tornasse insuportável. Ela carregava uma grande bacia com roupas, panelas e equilibrava-a na cabeça. Com o braço livre, carregava um segundo recipiente cheio de peixes e, assim, iniciava sua caminhada diária de meio quilômetro até o rio Seruini. Lá, lavava suas roupas, limpava os utensílios de cozinha e preparava os peixes para preservação, dependendo do rio para todas as suas necessidades diárias.
Hoje, Ferreira de Oliveira desfruta do conforto de lavar suas roupas em casa, com um ventilador refrescando o calor, tudo graças à mini-rede solar fotovoltaica que fornece energia limpa e renovável 24 horas por dia.
Essa mudança transformadora se tornou possível em 2021 com a instalação da rede elétrica, viabilizada, em parte, por 350.000 de dólares em subsídios da Charles Stewart Mott Foundation para o World Wildlife Fund.
“Em ecossistemas sensíveis como a Amazônia, a energia renovável fora da rede não é apenas energia — ela transforma a vida das comunidades florestais”, disse Daniela Gomes Pinto, oficial de programas da equipe de Meio Ambiente da Mott Foundation. “Como protetores tradicionais da floresta, quando suas vidas são melhoradas, eles se tornam aliados ainda mais fortes na luta para proteger a floresta tropical. Essas soluções energéticas protegem a floresta e contribuem diretamente para a mitigação das mudanças climáticas. Empoderar essas comunidades é uma das formas mais eficazes de garantir que a floresta continue de pé.”
A vida em Vila Limeira agora significa acesso à energia sustentável 24 horas por dia. Com acesso à internet na TV, a família de Ferreira de Oliveira pode agora desfrutar de ver os times de futebol do Brasil competirem. Todas as casas têm geladeira, máquina de lavar e meios avançados de produção agrícola. Isso trouxe independência para as mulheres, acesso ao ensino superior e a esperança de sonhar mais alto.
Desafios Históricos de Vila Limeira
Em 1958, Napoleão Oliveira da Silva mudou sua família para a Amazônia para trabalhar como seringueiro, seguindo uma política governamental que promovia o desenvolvimento na região. Como muitos seringueiros, Silva e sua família enfrentaram condições difíceis, presos em um sistema de servidão por dívida conhecido como “aviamento”, onde não eram pagos com salários, mas com suprimentos controlados pelos barões da borracha. Esse sistema explorador os mantinha em uma pobreza perpétua.
Com o declínio da indústria da borracha na década de 1970, o governo mudou o foco para a agricultura em larga escala e a pecuária. A família de Silva começou a cultivar em Vila Limeira, principalmente mandioca, para sobreviver. No entanto, a vida continuava difícil devido aos recursos agrícolas limitados e ao alto custo dos geradores a diesel. Cada família precisava de 10 litros de diesel por dia, o que fornecia apenas três horas de energia instável à noite. Isso custava R$5.000 por ano (cerca de US$1.000), quase 3,7 vezes mais do que as famílias em áreas maiores e mais populosas com acesso contínuo à energia pagavam.
Há seis anos, a comunidade unida começou a buscar soluções para o acesso igualitário à energia e uma forma de transformar suas vidas.
“Em 2018, fomos procurados pela comunidade de Vila Limeira”, disse Alessandra Mathyas, analista de conservação do World Wildlife Fund – Brasil. “Eles queriam entender como era a energia solar e como poderiam utilizá-la em sua comunidade.”
Mathyas organizou uma pesquisa sobre a quantidade de energia necessária para as casas e para a produção agrícola, além da escola, centro comunitário e igreja. Os resultados da pesquisa sugeriram que, em vez de painéis solares individuais, uma mini-rede fotovoltaica seria a melhor solução. O WWF começou a coordenar com Aurélio de Andrade Souza, diretor executivo da UsinAzul, uma empresa privada de consultoria em energia sustentável.
O dimensionamento do futuro sistema solar de Vila Limeira, feito por Souza, começou com a avaliação do consumo de energia da comunidade, reconhecendo também a demanda latente que poderia surgir. Ele antecipou que o consumo de energia aumentaria assim que um sistema viável estivesse em operação. Mathyas e Souza trabalharam juntos para levar em conta as necessidades energéticas atuais e os aumentos futuros projetados, incluindo o crescimento populacional devido à disponibilidade de eletricidade.
“O sistema foi projetado para lidar com períodos de baixa radiação solar durante o inverno da região”, explicou Souza. “Inclui um banco de baterias, painéis solares e um gerador de reserva, que foi usado apenas três vezes nos últimos três anos. Por volta do meio-dia, o banco de baterias já está totalmente carregado, o que significa que ele consegue atender facilmente às necessidades energéticas da comunidade durante a noite, quando não há radiação solar.”
Implementação da Energia Solar
A mini-rede solar estava inicialmente programada para ser instalada em 2020, mas a pandemia atrasou o projeto até 2021. A aprovação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), a agência federal que supervisiona o Sistema Nacional de Unidades de Conservação do Brasil, foi necessária antes que o projeto pudesse prosseguir. Após a aprovação, foi instalada uma rede de 30 kWp, com equipamentos modernos como um banco de baterias de lítio com uma vida útil de 15 anos e medidores individuais para cada casa.
O processo de instalação envolveu tanto o WWF quanto os moradores de Vila Limeira. A comunidade preparou a área para as redes solares, construiu um espaço de armazenamento para as baterias e treinou duas pessoas para a manutenção do sistema, incluindo o monitoramento do desempenho das baterias, consumo e carregamento.
Jonas Nogueira de Oliveira foi uma das pessoas treinadas e responsável pela manutenção e monitoramento da rede solar.
“Fui escolhido pelo pessoal daqui para cuidar desse material e equipamento”, ele explicou, com lágrimas nos olhos. “Trabalhei com os técnicos durante o processo de montagem, e em outubro de 2022, eles me enviaram para participar de um curso preparatório na sede da ION Energeia em Sorocaba.”
Nogueira de Oliveira passou por um treinamento intensivo de 27 horas para aprender a gerenciar e reparar equipamentos danificados, além de monitorar a quantidade de energia consumida e armazenada nas baterias do sistema de mini-rede.
“Meu objetivo é aprender mais a cada dia”, disse ele. “Farei o meu melhor para continuar o processo de melhoria da nossa usina solar e de tudo o que beneficia nossa comunidade, nossa população.”
O Futuro de Vila Limeira
A comunidade está atualmente planejando expandir seus esforços agrícolas, com o objetivo de produzir até 50 toneladas de açaí por ano. Eles estabeleceram várias metas para os próximos 20 anos, incluindo a implementação de projetos que aumentarão sua demanda de energia, continuar a reflorestação da terra e, finalmente, viver com zero impacto negativo na floresta tropical.
Com o aumento do acesso à energia solar, a comunidade poderá alimentar ferramentas agrícolas mais eficientes, sistemas de irrigação e refrigeradores de maior escala para seus produtos. Isso aumentará a produtividade, reduzirá o desperdício e abrirá novas oportunidades para o comércio com mercados maiores.
As famílias em Vila Limeira agora gastam R$720 (US$129) por ano com energia solar, reduzindo significativamente seus custos de energia. Ao diminuir os custos e melhorar a eficiência operacional, a comunidade aumentará sua produção econômica, o que ajudará a promover o desenvolvimento individual por meio de melhor acesso à educação, saúde e lucros aumentados.
Nesse processo, Vila Limeira pode se tornar um modelo para o resto do mundo.
“Hoje, temos energia em nossas casas, como a cidade tem”, disse Nogueira de Oliveira. “Temos energia aqui no interior, onde vivemos no meio da floresta. Ninguém jamais poderia imaginar que teríamos esse benefício, mas temos isso enquanto preservamos o meio ambiente, preservamos a natureza.”